Prova - Hertzberger


Complexo de corredores, segundo Hertzberger.


Os grandes corredores do segundo andar da Casa da Glória foram os escolhidos pelo grupo para servir de cenário para nossas intervenções. Escolhemos, inicialmente, pelo fato de não haver nenhum bebedouro em suas acomodações. Uma percepção um tanto quanto leiga, mas ela serviu de motor primário para uma análise (talvez) um pouco mais refinada do espaço.
Com os cômodos selecionados, principiamos a definir como gostaríamos de brincar com o espaço. Chegamos a conclusão de que tentaríamos desprogramar a característica de passagem dos corredores em algum grau.
O primeiro corredor (no caso, o de acesso ao auditório) é caracterizado por dialogar mais com a dualidade “público x privado” que os outros. Seu acesso permitido aos visitantes garante um uso literalmente público, mas é com as grandes janelas contínuas que essa mescla de conceitos se dá. O espaço é fechado, relativamente estreito (devido à proporção da planta), mas as janelas abrem o corredor para o pátio, garantindo a ampla vista e o amplo “ser visto”, bem como o acesso aos estímulos externos. Já os outros corredores são privados, em sua maior parte. Tanto o acesso é controlado quanto a sua forma, gerando uma maior sensação de introspecção e privacidade (demonstrada pela sensação de estranhamento toda vez que avistávamos desconhecidos passando por ele). Apesar dessa diferença, eles apresentam características em comum. São amplos, vazios, com intervalos muito bem definidos entre si, não dialogando espacialmente uns com os outros (a não ser pela vista das janelas e acesso das portas ou transições), sem irregularidades. Ao mesmo tempo que muito funcionais enquanto espaço de passagem (e portanto duros, inflexíveis) por seu vazio, são ótimas urdiduras em potencial para tramas mais flexíveis (dependendo apenas de uma diminuição do excesso de vazio). E é exatamente isso que tentamos fazer nas intervenções.
A primeira intervenção pensada foi a da criação de estruturas móveis inteligentes para o corredor de acesso ao auditório. Tais estruturas seriam capazes de reconhecer umas às outras no espaço e, com isso, gerar sons baseados na distância que se encontram. Dotados de um mecanismo de “liga e desliga”, esses objetos além de propiciar a exploração do espaço (com essa brincadeira de movimentação e modificação de uma paisagem sonora), ainda incitariam a permanência, já que poderiam ser utilizados como bancos ou mesas. Essa primeira modificação no espaço o transforma em uma “Forma Convidativa”. As estruturas desprovidas de função prévia, desenhadas de maneira a assumir formas geométricas básicas (paralelepípedos e cubos), que permitem sua movimentação e conjugação enquanto dialogam entre si, geram uma plasticidade que não inviabiliza seu uso enquanto espaço de passagem. Há a possibilidade de criação de espaços mais privados dentro de um espaço tomado como público (ao reunir as estruturas em pequenos grupos), mas também provoca a interação com usuários desconhecidos (com a brincadeira da paisagem sonora). Tudo isso traz irregularidades para o espaço, o tornando mais flexível.
A segunda intervenção é composta por um “teto interativo de pedras” instalada no corredor com a escada. Esse teto nada mais é que várias pedras roladas suspensas por um cabo que sobe e desce segundo um pistão sensível a ondas sonoras. A oscilação das ondas oscila as pedras, formando um tecido ondulatório, interativo. A intervenção não cria impedimentos para o trânsito de pessoas, nem sua modificação espacial para algo mais convidativo à não-locomoção. No entanto, há uma incitação à permanência (momentânea) ao trazer ao ambiente um estímulo visual não convencional. As pessoas ficariam mais tempo ali para experienciar o estranhamento e brincar com as pedras, estimulando talvez uma conversa que não tem por objetivo (ou único objetivo) a comunicação, mas sim a interação com a plataforma. O espaço, ou a urdidura, não é modificado pelo teto interativo (diferente das estruturas sonoras citadas previamente), mas sim como as pessoas o utilizam, ou a trama. Isso unicamente com a instalação de um componente contemplativo, uma irregularidade visual, mas não espacial.
Por último temos a intervenção no corredor do armário. Ela é constituída por vários tapetes triangulares, de grossuras diferentes e com “esqueletos” de arame, dispostos de maneira sobreposta ao fundo do corredor (ah é, vale lembrar que nós retiramos o armário do corredor :v). Os tapetes podem ser rearranjados para a criação de novos relevos e seu esqueleto mais rígido permite que os tapetes sejam dobráveis e fiquem estáveis em suas dobraduras. Isso cria um ambiente interativo, no qual o usuário pode exercer ativamente a sua construção. A utilização fica a critério da pessoa que usa, podendo sobrepor os tapetes para formar um banco, uma cama ou simplesmente dobrá-los formando um origami simples. Há aqui a criação de uma irregularidade, impedindo o trânsito (que já não era muito grande) e permitindo um uso flexível, sendo possível ainda criar gradações de territorialidade (o usuário pode criar ambientes mais privados, ao juntar tapetes o suficiente para fazer uma cabana).
Todas as transformações visaram a criação de irregularidades na urdidura que permitiam, em diversos graus, a permanência enquanto trama. A brincadeira com o caráter público e privado, bem como a gradação territorial, foram acidentais, sendo elas desdobramentos da função interativas que quisemos propor. Houve a tentativa de se criar uma forma convidativa, já que sem ela a interação não seria possível, o que sabotaria nossas intervenções. Por fim, é possível dizer que quisemos tornar os espaços flexíveis mas não polivalentes, já que devido a sua forma e as suas fronteiras com quartos e salas especializadas, o uso deveria ser ao menos condizente com a utilidade de trânsito (e com as necessidades de privacidade e isolamento das salas a eles conectados), não podendo assumir diversas formas.

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